terça-feira, 9 de setembro de 2014

Sim, há uma alternativa ao capitalismo: Mondragon mostra o caminho



Por Richard Wolff

Há uma alternativa (“Princípio Tina”) ao capitalismo?

Sério? Estamos a crer, com Margareth Thatcher, que um sistema econômico com repetidos ciclos sem fim, resgates financeiros dispendiosos para financiadores e agora austeridade para a maioria das pessoas é o melhor que os seres humanos podem fazer? Tendências recorrente do capitalismo em direção a desigualdades extremas e profundas de renda, riqueza e poder político e cultural exigem de resignação e aceitação – por que não existe alternativa?

Eu entendo porque tais líderes do sistema gostariam que nós acreditássemos no Princípio Tina. Mas por que os outros?

Claro, alternativas existem; elas sempre existem. Toda sociedade opta – conscientemente ou não, democraticamente ou não – entre formas alternativas para organizar a produção e distribuição de bens e serviços que torna possível a vida individual e social.

Sociedades modernas tem, sobretudo, optado por uma organização capitalista de produção. No capitalismo, donos privados estabelecem empresas e selecionam seus diretores que decidem o que, como e onde produzir e o que fazer com a receita líquida das vendas da produção. Esse pequeno punhado de pessoas faz todas essas decisões econômicas pela maioria das pessoas – que faz a maioria do verdadeiro trabalho produtivo. A maioria deve aceitar e viver com os resultados de todas as decisões diretoriais feitas pelos principais acionistas e conselhos de diretores que eles selecionam. Estes últimos também selecionam suas próprias substituições.

Capitalismo, portanto, implica e reproduz uma organização altamente não democrática de produção dentro das empresas. Os crentes no Princípio Tina insistem que não existem alternativas para essas organizações capitalistas de produção ou não poderiam funcionar quase que tão bem em termos de processos de produção, eficiência e de trabalho. A falsidade dessa alegação é facilmente mostrada. De fato, foi-me mostrado em algumas semanas atrás e eu gostaria de esboçar isso para vocês aqui.

Em Maior de 2012 eu tive uma oportunidade de visitar a cidade de Arrasate-Mondragon, na região basca da Espanha. É a sede da Mondragon Corporation, uma alternativa incrível de sucesso referente a organização capitalista de produção.

A Mondragon é composta de muitas empresas cooperativas agrupadas em quatro áreas: indústria, finança, varejo e conhecimento. Em cada empresa, os membros cooperados (uma média de 80 a 85% de todos os trabalhadores por empresa) são donos coletivos e dirigem a empresa. Através de uma assembléia geral anual, os trabalhadores escolhem e empregam um diretor-gerente e retém o poder para fazer todas as decisões básicas da empresa (o que, como e onde produzir e o que fazer com os lucros).

Como cada empresa é uma constituinte da Mondragon como um todo, seus membros devem conferir e decidir com todas os outros membros de empresa quais regras gerais irão reger a Mondragon e todas as suas empresas constituintes. Em suma, os trabalhadores-membros da Mondragon escolhem, contratam e demitem os diretores, enquanto que nas empresas capitalistas o inverso ocorre. Uma das regras adotadas de forma cooperativa e democrática rege os limites dos trabalhadores/ membros da Mondragon mais bem pagos a ganhar 6,5 vezes o valor dos trabalhadores menos pagos. Nada mais demonstra de forma impressionante as diferenças distintivas dessa forma com a organização alternativa capitalista de empresas (nas corporações dos EUA, CEOs podem esperar a serem pagos a 400 vezes o salário do trabalhador médio – uma taxa que aumentou 20 vezes desde 1965).

Dado que a Mondragon possui 85 mil membros (de acordo com seu relatório anual de 2010), suas regras de igualdade de remuneração podem e contribuem para uma sociedade maior, com renda e igualdade de riqueza muito maior do que é típico em sociedades que tem optado por organizações capitalistas de empreendimento. Mais de 43% dos membros da Mondragon são mulheres, cujos poderes de igualdade com os membros do sexo masculino, da mesma forma, influenciam as relações de gênero na sociedade, diferente das empresas capitalistas.

A Mondragon mostra um compromisso à segurança no trabalho que eu raramente tenho encontrado em empresas capitalistas: ela opera, bem como internamente, através de empresas cooperativas especiais. Os membros da Mondragon criaram um sistema para deslocar trabalhadores das empresas que precisam de menos para aquelas que precisam de mais trabalhadores – em uma forma totalmente aberta, transparente e governada por regras e com viagem associada e outros subsídios para minimizar as dificuldades. Este sistema focado na segurança tem transformado as vidas dos trabalhadores, suas famílias e comunidade também de formas únicas.

A regra da Mondragon de que todas as empresas devem obter recursos a partir dos melhores e menos dispendiosos produtores – sendo ou não aquelas empresas também da Mondragon – tem mantido a Mondragon na vanguarda das novas tecnologias. De igual modo, a decisão para usar de uma parcela de cada receita líquida dos membros da empresa como um fundo para pesquisa e desenvolvimento tem financiado o desenvolvimento impressionante de novos produtos. R&D, junto com a Mondragon, emprega hoje 800 pessoas com um orçamento acima de 75 milhões de dólares. Em 2010, 21,4% das vendas das indústrias Mondragon eram de novos produtos e serviços que não existiam há cinco anos antes. Além do mais, a Mondragon se estabeleceu e expandiu a Mondragon University; inscreveu 3.400 estudantes em seu ano acadêmico de 2009 à 2010, e seus programas de graduação estão em conformidade com todos os requerimentos do quadro europeu de educação superior. O total de inscrição de estudantes em todos os seus centros educacionais em 2010 era de 9.282 alunos.

A maior corporação na região basca, a Mondragon, é também uma das dez maiores corporações (em termos de vendas e emprego). Muito melhor do que sobreviver desde a sua fundação em 1956, a Mondragon tem crescido de forma impressionante. Ao longo do caminho, foi adicionado um banco cooperativo, Caja Laboral (sustentando quase 25 bilhões de dólares em depósitos em 2010). E a Mondragon tem se expandido internacionalmente, atuando hoje em mais de 77 empresas fora da Espanha. A Mondragon tem provado para si mesma capaz de crescer e prosperar como uma alternativa para com as – e concorrente das – organizações capitalistas de empreendimento.

Durante minha visita, em encontros aleatórios com trabalhadores que responderam minhas perguntas sobre seus trabalhos e benefícios como membros de cooperativa, eu encontrei uma familiaridade e um senso de responsabilidade pela empresa como um todo que eu associo somente com gerentes e diretores principais em empresas capitalistas. Essa conversa simples (incluindo desacordo), por exemplo, entre trabalhadores de linha de montagem e gerentes principais dentro da fábrica de máquina de lavar Fagor que nós vistoriamos, foi igualmente extraordinário.

Nosso anfitrião da Mondragon na visita nos lembrou duas vezes que o empreendimento deles é uma empresa de cooperativas com todos os tipos de problemas:

Não somos um tipo de paraíso, mas sim, uma família de empresas cooperativas lutando para construir um tipo diferente de vida ao redor, de uma maneira diferente de trabalhar”.

Todavia, dado a performance do capitalismo espanhol nestes dias – 25% de desemprego, um sistema bancário quebrado e austeridade governamental imposta (como se não houvesse alternativa ao que seja) – a Mondragon parece um agradável oásis em um deserto capitalista.

Traduzido por Rodrigo Viana. Para ler o artigo original clique aqui.


Richard D. Wolff é professor de economia e lecionou economia de 1973 à 2008 na Massachusetts University. Atualmente leciona no programa de graduação em International Affairs do New School University, como em Brecht Forum.

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